Posts Tagged 'Edson Flosi'

Um ano

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Foi muito rápido. Um dia nos falamos por telefone, como sempre, e alguns dias depois, fui encontrá-lo no hospital, já sem fazer nenhum sentido. Não houve definhamento, não houve involução. Acabou. Egoísmo meu querer que houvesse. Mas ser pega de surpresa, de uma semana para outra não ter mais meu conselheiro, orientador e confessor, meu pai amigo, exemplo e protetor, foi muito forte.

Na verdade, eu sei que havia 40 anos que eu deveria estar me preparando para o dia. Afinal, desde que nasci ele já percorria seu caminho rumo ao fim, como todos fazemos a cada dia que passa. Ele, naquela altura, já estava há 32 anos na jornada. Mas eu não me preparei, não soube como seria dura e profunda a dor que agora carrego.

Hoje ainda não posso acreditar que essa dor vá passar um dia. Talvez passe, mas hoje não passou e não tenho esperanças. É uma dor física e sentimental, que me acompanha todos os dias, há 365 dias. Acho que com o tempo, o que a gente faz é parar de aborrecer os amigos com as dores da existência e de seu fim e aí fica a impressão de que passou. Mas não passa.

Que o dia de hoje seja curto. Só isso.

Justiça cega?

Diz-se que a Justiça tem os olhos vendados para não ver a quem está julgando, permitindo assim que penalize os atos e não as pessoas. Daí que ao presidente do órgão máximo da justiça de um país, caberia julgar fatos e não boatos, interpretações e pessoas. Por isso, me assusta quando vejo que as atitudes do presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, são louvadas por muitos.

Em uma lição pela internet, durante o julgamento da Ação Penal 470, o mestre Edson Flosi alertou pelo twitter:

“Na ditadura, matavam sem provas. Na democracia, mandam para a cadeia”, em 11 out 2012.

“Condenar sem provas é ameaçar a democracia e a liberdade. #STF“, em 14 out 2012.

“Inverteram um princípio do Direito: na dúvida, absolve-se o réu (in dubio pro reu). Agora, ficou assim: na dúvida, condena-se o réu. #STF“, em 15 out 2012. 

“A narrativa não tem provas. Mas condenar sem provas não é coisa nova. Aconteceu na Alemanha de Hitler e na Itália de Mussolini”, em 17 out 2012. 

“Condenar sem provas é o mesmo que condenar por ouvir dizer.”, em 17 out 2012.

“A História se encarregará de absolver um dia os que foram injustamente condenados. #STF #Mensalão #AP470“, em 17 out 2012.

Pena que o Flosi não ficou por aqui para ver quão breve a condenação injusta seria desmascarada.

A questão é que as pessoas comuns, como eu, você, o padeiro e a cabeleireira, podem ter seus ranços pessoais e vibrar com este ou aquele sujeito sendo preso, porque não vamos com a cara dele, não acreditamos na sua honestidade ou desaprovamos sua conduta. Mas um juiz não pode. De acordo com notícia de O Estado de S. Paulo, de 28/2/2014, o próprio Barbosa afirmou que a investigação foi mal feita, não reuniu as provas necessárias. Em março de 2011, de acordo com a matéria, deu-se a seguinte cena: “[Joaquim Barbosa] Dizia estar muito preocupado com o julgamento do mensalão. A instrução criminal, com depoimentos e coleta de provas e perícias, tinha acabado. E, disse o ministro, não havia provas contra o principal dos envolvidos, o ministro José Dirceu. O então procurador-geral da República, Roberto Gurgel, fizera um trabalho deficiente, nas palavras do ministro.”

E mesmo assim, se condenou. Isso é muito grave. Hoje é com eles e você até pode simpatizar com o resultado por não simpatizar com os condenados. Amanhã com quem mais será? Como disse o Flosi, condenar sem provas ameaça a liberdade e a democracia. Para todo mundo. O procurador-geral tinha por obrigação juntar mais provas. Não era simplesmente achar que o clamor das ruas e as manchetes de jornal bastariam e então ele poderia fazer um trabalho meia-boca. Ou ele procurou, mas não encontrou provas. Eu repito, isso é grave, não apenas pelos que estão presos no caso, mas por toda a população que passou a ficar desamparada da justiça. Não ter prova contra você não significa mais que você não seja culpabilizado.

E é tão grave quanto foi a forma que Barbosa escolheu para definir as penas. Algo do tipo: “Bom, eu queria que fulano fosse exilado na Sibéria. O que tem que ter feito para se conseguir esta pena?”. Ele mesmo confessou que foi uma conta de chegada. Quando a justiça, para ser justa, deve agir diferente: analisa-se os crimes cometidos e aplica-se a pena de cada um deles.

No minuto 1 e 20 segundos do vídeo abaixo, Barbosa confessa que foi feito assim mesmo:

Ele alega que a decisão dos outros ministros não é técnica, é simplesmente política, mas confessa ele mesmo ter feito exatamente isso. Ou seja, se desmoraliza sozinho.

Para entender meu ponto e minha preocupação, faça um exercício de abstração: esqueça os nomes dos envolvidos, o partido político e os cargos aos quais estavam vinculados. Pense apenas que houve uma denúncia pelos jornais, mas que na apuração do caso não houve comprovação da denúncia. As pessoas deveriam ser punidas como se culpadas fossem? Lembra do caso Escola Base? É o exemplo mais marcante em nossas memórias hoje, mas não é a única vítima da mídia irresponsável.

Eu gostaria que os demais brasileiros não fossem tão vis quanto o presidente do Supremo Tribunal Federal, que se deixou encantar pela dita grande mídia para cometer um ato descabido e de pouco profissionalismo. Eu não aguento…

Uma aula do Flosi na internet

Quando meu pai, o jornalista Edson Flosi, começou a lecionar, eu já havia me formado. Portanto, não tive aulas com ele. Pelo menos não em sala de aula. É bem verdade que quem teve nos primeiros anos sempre tem algumas ressalvas a fazer, como pudemos ler no Facebook, nos dias que seguiram ao seu falecimento. De fato, nas conversas em casa percebíamos, pelos relatos dele sobre as aulas, que ainda faltava o traquejo necessário. Mas uma coisa era certa: desde sempre ele adorou ensinar, transmitir conhecimento, dividir o que sabia. E os alunos, mesmo aqueles dos primeiros anos, percebiam isso e valorizavam sua capacidade de doação.

Os anos passaram, ele aperfeiçoou os métodos, flexibilizou as regras e as aulas tornaram-se memoráveis. Assim, as histórias ganharam as páginas das redes sociais na internet e hoje há pessoas que, mesmo sem nunca terem visto o Flosi pessoalmente, são capazes de narrar passagens de suas aulas que se tornaram clássicas, como os exemplos de injúria, calúnia e difamação ou a diferença entre sequestro e rapto.

Em 2012, o jornalista Sérgio Gomes, diretor da Oboré, juntou duas gerações da família em uma entrevista: o genro Eduardo Castro entrevistou Edson Flosi no Centro de Imprensa/Redação Escola da Oboré.

Agora, os vídeos da entrevista estão disponibilizados na internet e todos podem assistir a mais esta aula do Flosi. Ele mostra, por exemplo, o valor que há em apreendermos o sentido exato de cada palavra e pensarmos nele quando falamos ou escrevemos. Edson Flosi ensina que sensacionalismo não é o problema do jornalismo. O problema é quando se trata com sensacionalismo casos que não são sensacionais. “O sensacionalismo no caso do PC Farias foi grande, mas é que o caso foi sensacional”, afirmou na entrevista.

Quantos já tinham pensado em que há situações onde o sensacionalismo cabe? Situações sensacionais, por óbvio. Mas o óbvio tem sido mesmo difícil de ser reconhecido pelos jornalistas hoje em dia.

Na entrevista, Flosi conta casos que só o genro poderia arrancar dele, por conhecer os bastidores de suas reportagens, contados à mesa de jantar ao longo de 20 anos. Uma entrevista leve e saborosa, como sempre foram nossas conversas em volta da mesa de jantar.

O Flosi se foi

Todo poder aos estudantesFaleceu na cidade de São Paulo, onde nasceu e viveu por 73 anos, Dr. Flosi, como ele gostava de ser chamado, ou Professor Flosi, como ficou mais conhecido nas últimas décadas. Para mim, o Velhinho.

Não consigo escrever nada, mas sinto que nem preciso, diante de tanto que foi escrito nos últimos dois dias, desde que foi divulgada a notícia de seu falecimento.

Mais uma vez, fica provado que eu não sei mesmo lidar com esse negócio de morte. Meu cérebro está imprestável.

Está aí uma coisa que eu não aguento.

No ar, o blog do Flosi

Afinal, o jornalista, advogado e professor Edson Flosi, que convive com o câncer há alguns anos e em 2012 foi demitido da faculdade Cásper Líbero após mais de uma década de serviços prestados, resolveu ter um blog. Já está no ar o blog do Prof. Edson Flosi.

blog do Flosi

Ele continua avesso ao computador e faz seus trabalhos em sua máquina IBM, como contaram as agora jornalistas Élide de Souza Lima, Ana Luíza Vastag, Anne Caroline Cavalcante e Joyce Broda em seu Trabalho de Conclusão de Curso, da Universidade Anhembi-Morumbi, que narra a trajetória do Flosi. Mas isso não o impediu de perceber a importância das novas mídias. Desde o ano passado, ele está no Facebook e no Twitter e agora lança o blog.

É a turma do ‘enta mostrando do que é capaz. Afinal, quem aguenta uma disposição dessas aos 73 anos?


placa Cabo da Boa Esperança

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